segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Anestesia

 Sim. É um fim de tarde de segunda e eu quero dormir, pelo menos para resgatar as horas de sono que perdi durante a noite passada. Ainda não me acostumei com o horário de verão, mas posso afirmar que não é culpa dele essa minha fadiga. As luzes do quarto estão apagadas, a sensação de que meu dia está indo embora torna-se maior. Posso olhar para trás e tentar ver o que fiz hoje; posso simplesmente esquecer e planejar o amanhã; posso deitar-me em minha cama e não fazer nada.
 Sensações como essa me consomem de angustia. O ser orgulhoso e prepotente que costumo ser se torna frágil e levemente explosivo - não contra os outros, mas contra mim mesmo. A dor de cabeça não me impede de escrever, nem aqui nem na escola. Passam-se os minutos da minha folga e ainda não tirei meu uniforme, pois sei que essa postagem é mais importante que qualquer coisa que eu possa fazer agora.
 Minha janela aberta exibe uma grande árvore e suas ramificações, são tantas elas que me torna ainda mais confuso. São em momentos como este que não consigo pensar em absolutamente nada. O que escrevo aqui é o que surge, não na minha cabeça, mas na minha visão. Meu corpo está cansado e me arrasta para baixo, estou tão perto do chão que poderia fazê-lo de leito neste momento. Dores fortes no meu pescoço confirmam a minha tensão. A única coisa que se oculta em meio a estes devaneios loucos é o motivo pelo qual eles ocorrem. O som das coisas soa mais alto, ou talvez minha audição esteja aguçada; meus olhos estão profundamente cansados, estou bocejando a cada cinco minutos e nada do que vagamente penso ou escrevo aqui muda meu semblante emburrado e insatisfeito.

 Eu não poderia dar nome a isso.Alguns diriam que é um desconforto comum levado de uma segunda-feira agitada, outros diriam que estou precisando de um médico pelas minhas frequentes dores de cabeça. Eu digo que preciso ficar em paz, sem ao menos ver ou ou ouvir nada e ninguém. Esse tipo de pensamento isolado não é a porta que me levará aos meus objetivos, mas provavelmente me dará um pouco mais de força para alcançá-la - pois não a sinto tão longe.
 Na verdade me cansei de procurar respostas. Depois que percebi minhas próprias idéias se colidindo, decidi não lutar mais contra aquilo que não posso provar. Minha mente aponta setas para todos os lugares, pois quero muito mais, mesmo que ainda não possua nada. Vejo projetos se levantando contra minha procrastinação mas ao mesmo tempo eles desabam como ruínas que levantam grande poeira. Para me limpar é preciso de alguns cuidados especiais, nada que eu não possa resolver rapidamente para me sujar de novo na mesma fonte de infortúnios.


 Quero problemas e preocupações longe de mim e dos meus sentidos. Me sinto mal assim mas nem imagino a vida de quem leva tudo isso à sério. Tal atitude não cria em mim arrependimentos, mas distorce minha visão coletiva da liberdade, assim prefiro abrir minha boca somente quando necessário. Pois palavras de sabedoria são transformadas em gozação, e conversas tolas não levarão ninguém à redenção.
 Tomar decisões é difícil, largar o que é certo pelo que talvez valha a pena também não é fácil. Se meu momento de escolha fosse exatamente este eu estaria perdido, literalmente. Continuo roendo minhas unhas pois não encontro a forma certa de extravasar minhas vontades, tenho agido conforme mandam os padrões da minha sociedade, meus horários estão devidamente corrompidos, a noite cai enfim sem que eu adquira a essência do dia que morreu e escorregou pelas minhas mãos.
 Não sei explicar o que me faz mal, assim como não sei como o próprio inferno pode ser tão cruel. Ainda não tenho noções básicas do meu espaço, e por isso saio por aí 'trabalhando'  e tentando arrumar algo que me distraia de verdade. Algo que seja distinto das mazelas do mundo da sua escória grotesca. Não nego que sou diferente da maioria das pessoas pois - ainda cansado - meu orgulho não me permite.
 Quanto a todos os meus erros, não quero encontrá-los por agora também. Talvez eu peça uma breve audiência no dia em que tudo estiver frio na mente e nada vá me atrapalhar. A última coisa que preciso depois de uma terrível maldição são sermões que esfreguem na minha cara os meus pecados. Minha culpa cairá sobre mim e caberá à mim a punição. Reconheço então que minhas atitudes não valem pelo meu juízo, pois pra mim este é aquele que se usa na hora certa fazendo a coisa errada. Penso tolo e imaturo mesmo assim, tendo feito tudo errado em horas inoportunas, diante da minha pobre vontade.
 Meu castigo será plausível e aceitável. A vida me mostrará mais uma vez que sou um forte barco mas ela é quem manda na maré. Meu próximo round começará em breve, até mesmo antes que este termine. Minha luta tornou-se um conflito particular e opcional contra as idéias que me cercam. Sei aonde estou e o que precisa ser feito, mas agora só me resta um parágrafo no post antes do meu precioso descanço.
 A luz se foi completamente. Meu quarto agora está escuro e a árvore lá fora agora é só uma mancha. Continuo escrevendo e trajando meu uniforme, sem ao menos sentir a necessidade de clarear o ambiente. Essas trevas enigmáticas me conduzem ao descanso e me livram das correntes, me libertam da podre e pecaminosa carne humana que contamina meus princípios. Ainda agradeço por isso, cada vez mais enxergo quem sou e reconheço minhas fraquezas, a cada ofegante suspiro contra o frio da manhã, sinto que o ar envolve mais forte meus pulmões. A vida pode terminar em um segundo, mas ainda tenho fôlegos para contar a história da minha vida comum - antes que termine o dia.

"Is not enough, it never is..."

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