quinta-feira, 10 de março de 2011

Apagão

 Me despedi, desliguei o computador, carreguei minhas coisas até o carro e por um momento lamentei em deixar pendências para trás, mas era feriado e eu queria dar um tempo de muita coisa - descansar.
 As possibilidades para o período prolongado eram inúmeras, desde ficar em casa aguardando a chamada dos amigos próximos, até viajar para a cidade vizinha visitar eternos amigos de uma inesquecivel temporada. No meio termo, desembarquei em meio a terra do sossego. Seguindo a linha dos meus objetivos, este seria o lugar não tão bom e não tão ruim, mas certamente ideal e encaixado.
 Uma única chuva pairou sobre todos os metros quadrados de tranquilidade durante os dias que seguiam rapidamente as datas vermelhas do calendário. Entre o video-game, leituras fantásticas e um mergulho na piscina transbordante, uma brave parada para admirar o cenário em volta. A bela mistura de cinza e verde, por vezes, fazia perder a noção entre dia e noite; visões simples, fantásticas e subitamente únicas.
 Das faltas, uma companhia iria me fazer bem durante a longa estada. Da liberdade explorei o máximo; sem regras ou horários para comer, dormir e se distrair - não necessáriamente nesta ordem. Da existência, havia eu e minha mente descansada; e absolutamente nada poderia quebrar este elo. Do resto, muitas coisas desapareceram através dos dias, me esqueci de tudo, me livrei das cargas, obrigações e responsabilidades. Em relances, uma suave vontade de voltar para casa surgia, sendo esmagada pelo ilusório pensamento de que aquele simples paraíso poderia ser eterno, por mais dois ou três dias.
 Hora de voltar. A vontade que antes era branda se mostrava maior e mais forte, mas ainda faltava algo. Como na ida, o retorno foi banhado pelo constante chuva, um silêncio e nada mais; além da incessante e estranha sensação de haver algo faltando mas não saber o que era. Tão óbvio e escondido pelas brumas, aonde estava minha mente quando tudo começou a tremer e se desfazer diante da estrada?
 Foi ficando pior e se misturou com a fome que eu estava sentindo, minha cabeça começou a doer e as coisas não estavam muito claras, ou claras demais, dependendo dos carros que vinham no sentido contrário. Vozes e imagens tornaram-se levemente distorcidas, por mais que minha vontade pedisse, me controlei para não pedir ajuda e assim tentei me acalmar para ver se tudo voltava ao seu lugar.
 O caminho para casa foi reconhecido depois de longos minutos de uma tortura incomum. Pensei que não seria capaz, mas consegui carregar tudo até o quarto, aonde, depois de me assentar na cama e muito pensar, fui atingido por um golpe direto na mente. O céu se abriu através do teto e agora sim, estava claro demais. Cego pela luz, com as mãos suadas e o pescoço tenso, a calma que há muito carregava durante todo o feriado desapareceu quando o mundo real voltou ao seu devido posto na minha cabeça.

 Estive pálido durante o resto da noite e dormir foi difícil, pensei muito sobre como consegui me esquecer da vida de uma forma tão literal. Sentindo-me impotente, não sabia se eu estava preparado para tanto, o que era comum tornou-se estranho e assustador, e por sorte não me causou pesadelos. Planos para o fim de férias foram deixados de lado para que eu pudesse encontrar uma forma de equilibrar as coisas. Horas voaram como dias e depois de me apagar do mundo, acordar assustado e apagar as luzes, apaguei.
 O dia seguinte me acordou naturalmente. Foi estranho e delicioso, me sentia bem de novo. Preferi não entender muito o que houve, mas teria que traduzir toda aquela viagem em mais uma relato melancólico. Menos de vinte e quatro horas depois, as sensações sinistras pareciam nunca haver existido. Agora estou de volta à minha realidade, num lento processo de readaptação.

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